domingo, 19 de agosto de 2007

Espaços de vida

Não esperes mais por mim

Já não saio daqui. Sou cobarde

E tenho-me assim absurdo. E é tarde

Pela sina do tempo, coisa ruim.

E como me vejo só mas esperado

Entardeço-me até que atrasado

De modo mais que perfeito

Me abandone à sombra que trago

Enclausurada em meu peito

Sob a forma de um afago.


Vai, vai-te sem demora

Que eu já não me vou. E depois

Corrobora que não tenho minha hora

Nos minutos de nós dois.

Como eu não querendo queria

Fazer o que então quereria

Por essa estrada perdida

Onde se espraia quem tem

Sua fé toda vencida,

Seu espaço tão além.


Agora que já te foste, segura,

Vive a vida como se ela fosse tua

Nessa farsa manifesta que perdura.

Eu sou o solitário na multidão da rua,

A presença tão ausente da vista,

Da obra o desconhecido artista.

Não, não voltes nunca mais

Que eu parei de me ser, de vez,

Numa queda abrupta de sinais

Desfiz-me da vasta agudez.


Oh, quão infrutífera minha fadiga!

Nada consigo apagar deste tormento,

Maldita úlcera qu´em mim se empertiga.

Gerada pela ferocidade do sentimento

É dardo acerado cravado em meu peito,

Suplício casado com laço imperfeito.

Sou um náufrago de lassa escuna

A aguardar por mim, pelo que sou

Não me existo, ando à tuna

Na noite que se me abeirou.


Adeus,

Despeço-me de mim, não de ti,

Porque me tenho cansaço

Se um dia voltares estarei aqui

Mas já serei de mim assaz escasso.

É-me indiferente se vais regressar

Aquele que te quer já se vê a expirar.

Se vieres ele já cá não estará

Será apenas lembrança do passado

E então nada mais te restará

Senão repousares a seu lado.


João Vasco

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