Foto: autor desconhecido
Aqui parei-me. Estagnei. Sou
preso e guarda prisional. O tempo que já passou desde que para cá vim é feito
de demasiados dias para que os tenha contado. Já não me sei senão aqui. Terei
que me ir, um dia destes, quando me for fácil.
Ontem voltei a ouvir vozes.
Ruídos de quem fala um sítio que não é seu. Sussurros que se prolongam, vozes
arrastadas deixando lastro. E ficaram por aqui, a pairar como nuvens
tresmalhadas, demasiado longe para aconchegarem e demasiado perto para não importunarem.
E senti-me a mais, com urgência em partir apesar do receio de que regresses
para uma casa vazia. Sim, tenho que ir, tenho que ir…Mas e se tu ainda vens?
Não te dei nome. Não te dei voz.
Não te dei rosto. Dei-te sorriso. Fiz mais do que pude. Inventei. Do nada. Por
artes mágicas. As artes já são colossais, mas mágicas? Rendo-me ao que me
esmaga. Porque sempre soube que era pequeno. E sou. E serei. E já cresci muito
e mais vou crescer. Mas é como se mingasse. Caibo em todo o lado e nada é do
meu tamanho. E nós? Eu e tu. Agora. Somos nada. Somos os dois como se não
fossemos. Agora. E depois? Os pés e as mãos dão-nos a resposta que os olhos
começam.
Ainda ontem era inteiro não fosse eu estar comigo repetidas
vezes.
João Vasco