quinta-feira, 28 de junho de 2007

Anjo triste

Conheci um anjo. Olhar puro, sorriso melífluo e riso terno de criança. Como ele é bom! Fez-me voltar a acreditar na bondade. Mas suas asas foram cerceadas. Queria voar de novo. Ele agora não me pode valer. Está triste. Enquanto ele estiver assim suas asas não crescem. Tenho que o ajudar a ser feliz. Ele fez tanto por mim e nem sabe. Porque a indulgência é-lhe natural e tudo o que ele faz toca profundamente os demais. Preciso de o fazer rir. Mas como o hei-de fazer? Ele está profundamente triste. Eu também fico triste por vê-lo triste. Ele não me diz a razão da sua tristeza mas eu já sei qual é. Este anjo caiu do céu porque tem dado mais amor do que tem recebido. E o amor é como a respiração, tem que haver um equilíbrio entre o que se recebe e o que se expele porque senão vamos perdendo, lentamente, o amor que trazemos, até que fiquemos completamente taciturnos. Ele já está assim. Mas não por muito tempo porque afinal só tenho que o amar. E é tão simples amar…


João Vasco

Obrigatório

segunda-feira, 25 de junho de 2007

Quando acordo, quem sou quando me encontro? Um pouco que não é o que sou. Um ente perdido no vazio sem identidade. E se esfuma este pequeno ser que irrompe na antecipação da consciência. É minha tábua rasa, meu eu oco de experiência, sem memória. Esse sou eu mesmo, porque o outro já me traz somente como fenómeno residual. Porque sou então tão pouco de mim?


João Vasco

Obrigatório

terça-feira, 19 de junho de 2007

Sentimento Derramado

De uma noite és o luar

De uma flor um canteiro

De um rio és o mar

És a beleza por inteiro.


De um olhar a paixão

De um beijo o amor

De um reencontro o perdão

És das emoções um louvor.


De um riso és a alegria

De um abraço o afecto

De um sorriso a empatia

És jovialidade em concreto.


De um verso um poema

De um meneio uma dança

De uma nota és um tema

És a chama que m´alcança.


De um suspiro o desejo

De um gemido o prazer

De um pássaro o adejo

És princesa de meu querer.


De uma brisa és a sageza

De um vento a liberdade

De um fado a tristeza

És a muita saudade…


Oh doce menina

A que uno minha mão

Se fosse pequenina

Esta minha paixão

Não pareceria pequeno

Meu enorme coração.


João Vasco

Obrigatório

sexta-feira, 15 de junho de 2007

Ad Eternum

Eu que por existir tenho o meu fim

Trago não só o que acaba em mim,

Abarco um áureo sentimento infinito

O amor eterno que por ti permito.

E, no entrementes, quando eu me for,

Por entre as sombras do passado,

Meu pletórico sopro de amor

Se fará nimbo do céu estrelado.


João Vasco

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Obrigatório

Era eu ao longe. Era eu aqui. E qual dos dois era eu? Perguntei-me… não obtive resposta. A qual dos dois perguntei? Àquele que julgo ser eu ou a um outro meu eu? E quem me perguntou? Aquele que ainda sou eu ou um outro que se faz em mim? Quantos tenho em mim? E quantos ainda terei? Quantos tive? E o eu que sou agora se calhar já não sou eu… Eu, que afinal sou tantos de mim…


João Vasco

domingo, 10 de junho de 2007

Obrigatório

Procuro palavras. Em mim. Por mim. Sem mim. E o que encontro? Pouco amiúde o que procuro. Esforço-me o suficiente em minhas diligências ou me acobardo na indolência? E saberei eu avaliar sem necedade ou imperícia o que deve ser alvo de busca? Ou como deve ser perseguido tal desiderato? E se do ouro reluzente eu não veja sua cintilação e fique radiante perante a refulgência de pechisbeques? Toda a escolha é difícil. Há sempre o medo de errar perante a razoável probabilidade de tal acontecer. Como me isento de mim? Talvez só morrendo…ou nem sequer assim…E isto são apenas palavras, as tais que vieram até mim.

João Vasco

quarta-feira, 6 de junho de 2007

...

"Em ti está a cura desta chaga

Que me consome, infame.

Tal como me aflorou, em vaga,

Assim se vá e não mais me chame."

...

in "O Tempo das Coisas", João Vasco

Já não me lembro das últimas palavras que disse. Há quanto tempo isso foi? Muito? Pouco? Não tenho ideia. Pode ser um problema de memória ou uma crónica falta de atenção. A falta de atenção não é mais do que uma atenção descentrada da realidade objectiva (prodigalizada pelas percepções de nossos sentidos) e focada numa qualquer elucubração. Dualidade confusa. Em que me devo atentar? Porque o tempo não espera…E as palavras de cada instante já foram ditas ou ficaram por dizer. Poderão ainda vir a ser ditas, mas já serão outras ainda que as mesmas. E quais foram as que eu disse? São as mesmas de sempre, não tenho muito para dizer, não há muito para ser dito…

João Vasco

terça-feira, 5 de junho de 2007

segunda-feira, 4 de junho de 2007

Lá fora tudo acontece em bruto. Aqui tudo emerge adulterado. Não sei se é a minha visão inquinada, fruto de pensamento turvo, que me faz ver as diferenças. E se eu perguntar a alguém? A quem? Não será ele um produto da minha ciência? Preciso que alguém me diga, sem que eu ouça, o que é a verdade. E se quem me ajudar também estiver a braços com um dilema? Serei eu sua âncora e ele meu anzol? Ou seremos os dois um pedaço de fio do mesmo novelo intrincado? E qual será o real comprimento desse fio emaranhado? Para mim já não tem comprimento que se meça. Dá demasiado trabalho mesurar o que não tem fim. Começa-se, a todo o vapor, para, à medida que o tempo avança, se ir diminuindo o ritmo, até que se desista por se acabar por se entender que não vale a pena, é inútil. E como se pode concluir a eternidade de algo que nem sequer sei se existe ou se apenas é conceito que em mim criei? Quanto há a mais em mim? Pareço distante de tudo…E só uma janela me separa do que há lá fora.


João Vasco

domingo, 3 de junho de 2007

sábado, 2 de junho de 2007

Tá Combinado


Então tá combinado, é quase nada

É tudo somente sexo e amizade.
Não tem nenhum engano nem mistério.
É tudo só brincadeira e verdade.
Podemos ver o mundo juntos,
Sermos dois e sermos muitos,
Nos sabermos sós sem estarmos sós.
Abrirmos a cabeça
Para que afinal floresça
O mais que humano em nós.
Então tá tudo dito e é tão bonito
E eu acredito num claro futuro
de música, ternura e aventura
Pro equilibrista em cima do muro.
Mas e se o amor pra nós chegar,
De nós, de algum lugar
Com todo o seu tenebroso esplendor?
Mas e se o amor já está,
se há muito tempo que chegou
E só nos enganou?
Então não fale nada, apague a estrada
Que seu caminhar já desenhou
Porque toda razão, toda palavra
Vale nada quando chega o amor...

Caetano Veloso

sexta-feira, 1 de junho de 2007

Obrigatório

Teus lábios

Como eu sempre me lembro

De teus lábios inauditos

Amenos como tarde de Setembro

Joviais lugares infinitos.


Ah! Esse sabor adocicado

Com um travo assisado de acidez

Berço do amor e do pecado

Em que se esboroa minha lucidez.

Pudesse eu o tempo congelar

Para juntar teus lábios aos meus,

Num beijo para nunca acabar,

Em puro idílio dos céus.


In "O Tempo das Coisas" , João Vasco